Estratégia

A receita para o sucesso no mundo pós-Covid

Guilherme Lerner
Guilherme Lerner June 16, 2020
A receita para o sucesso no mundo pós-Covid

Para Scott Galloway, o sucesso do varejo depende de modelos de receita recorrente, boas histórias para contar e controle da interação com os consumidores

Um dos críticos mais vorazes da valorização acentuada das big techs, o professor Scott Galloway, da NYU, traz sempre um alerta sobre o poder da Amazon, Apple, Facebook e Google no mercado global. Não sem motivo: a Apple, por exemplo, adicionou a seu valor de mercado nos últimos cinco anos o equivalente a toda a indústria de bens de consumo global. “São empresas muito poderosas que pagam pouquíssimo imposto e não geram aumento de competição nos mercados em que atuam. Será que devemos estar confortáveis com essa situação?”, questiona.

Para Galloway, os chamados “quatro cavaleiros do apocalipse” são monopólios não-regulamentados, o que cria uma condição ideal para crescimento acelerado e uma incrível valorização de mercado. Por mais que essas condições sejam raras e poucas empresas passem por esse ciclo, é possível aprender com elas e entender quais práticas podem ser aplicadas para acelerar a transformação digital do seu negócio.

No primeiro Collaborative Commerce Talks, série de webinars de discussão sobre a digitalização dos negócios, Scott Galloway mostrou como desenvolver uma estratégia vencedora na era digital e apresentou fatores de sucesso que podem ser aplicados por empresas de varejo para acelerar sua expansão.

O ponto da virada

Um dado que mostra o quanto o varejo está mudando durante a pandemia é a penetração do e-commerce nas vendas totais do setor. Nos Estados Unidos, na última década o comércio eletrônico ganhou, em média, um ponto percentual de participação de mercado por ano, saltando de 8% para 18% do total do varejo. “Desde o início da pandemia, esse percentual subiu para 28%. O e-commerce avançou uma década em dois meses”, comenta Galloway.

Assim como acontece no Brasil, esse movimento acontece pelo fechamento de lojas físicas, que obriga os consumidores a comprar mais on-line. “Quando a situação for normalizada, essa participação cairá um pouco, talvez para uns 25%, mas não muda o fato de que o digital passa a ter muito mais importância no consumo das pessoas”, afirma o especialista.

As empresas de um trilhão de dólares

Estamos em um momento inédito da História. A Amazon já alcançou um valor de mercado de US$ 1 trilhão, a Apple está próxima disso e o resultado é uma concentração de poder econômico nas mãos de poucos. “Nos últimos cinco anos, a Apple acrescentou ao seu valuation o equivalente a toda a indústria de bens de consumo, enquanto a Amazon adicionou o equivalente ao faturamento de todos os supermercados da Europa”, comenta.

E esse é um movimento de concentração que vem se intensificando: há dois anos, o conjunto formado por Google, Amazon, Apple, Microsoft e Facebook valia tanto quanto 282 empresas do índice S&P 500. Hoje, equivalem a 350 empresas. “A digitalização dos negócios durante a Covid-19 acelerou ainda mais esse movimento, pois são empresas que lideram a inovação global e conquistam uma parcela desproporcional do valor econômico”, analisa.

Como chegar lá

Para Galloway, as empresas que estão chegando ao trilhão de dólares em valor de mercado e protagonizam as ações têm uma série de pontos em comum, que podem ser aplicados por varejistas de qualquer segmento em sua busca por mais clientes, crescimento de vendas e melhores resultados. Esses fatores são:

Apelo ao instinto humano

As empresas mais bem sucedidas do mercado conseguem se conectar diretamente a instintos primários do ser humano, como a sobrevivência e a procriação. “A Apple comunica, em tudo o que faz e no design de seus produtos, que o usuário é uma pessoa especial, bem-sucedida e poderosa. Esse é um driver primário para procriação e tem um forte impacto no nosso sistema límbico”, explica Galloway. O mesmo acontece com a forma como nos apresentamos nas redes sociais.

A Amazon também apela ao nosso senso de sobrevivência, porém de outra forma. Segundo o especialista, “a possibilidade de obtermos mais por menos e, com isso, alimentarmos melhor nossa prole, é um instinto poderoso que a empresa explora muito bem”.

Receita recorrente

Empresas com altas taxas de receita recorrente têm desempenho melhor na Bolsa de Valores. “São empresas que já ‘casaram’ com os clientes, estabeleceram relacionamentos mais profundos. Elas não precisam gastar com roupas caras ou perfume: elas investem menos em marketing, mas de forma mais assertiva”, diz Galloway.

Aqui, a Amazon é a grande referência: os membros do programa Prime, presente em mais de 120 milhões de residências americanas, gastam em média US$ 800 a mais por ano do que um cliente comum. Receita recorrente equivale a acesso a capital barato.

Integração vertical

Empresas que controlam do design do produto à sua fabricação e distribuição conseguem preservar suas margens, aumentam seu grau de diferenciação, têm mais capacidade de estabelecer um “território de marca” para si e obtêm resultados financeiros superiores. “A integração vertical reduz o atrito no relacionamento com o cliente e adiciona um valor incrível a quem consegue fazer”, afirma o especialista.

A questão é que é caro estabelecer uma operação integrada verticalmente. Leva tempo e exige acesso a grandes fontes de capital. “Poucos têm esse poder, mas é um enorme diferencial para quem consegue fazer, pois cria um relacionamento sem barreiras com os consumidores”, analisa.

Aceleração de carreiras

As empresas com maior avaliação de mercado do mundo são empresas nas quais as pessoas querem trabalhar. “Elas funcionam como referências, são credenciais de qualidade para os profissionais”, diz Galloway. Para isso, elas são obsessivamente meritocráticas e até cruéis na forma como dispensam colaboradores. “Nesse tipo de empresa, só há dois caminhos: subir na hierarquia ou sair do caminho. Por isso, é um modelo para poucos”, completa.

Gostem de mim

Empresas e pessoas que são agradáveis têm menos possibilidade de serem processadas e são protegidas, mesmo que inconscientemente, contra críticas. Tim Cook, o CEO da Apple, e Jeff Bezos, CEO da Amazon, são dois exemplos disso. “Cook foi um dos primeiros CEOs a ‘sair do armário’ e Bezos tem um discurso convincente de fazer o melhor para os clientes. Suas empresas têm um impacto muito mais danoso do que a Microsoft dos tempos de Bill Gates e Steve Ballmer, mas recebem apenas uma fração das críticas”, compara Galloway.

Para ele, isso se deve à simpatia de Cook e Bezos e à sua capacidade de manter uma narrativa favorável. A capacidade que a liderança da empresa tem de ser simpática e obter uma cobertura favorável da imprensa é algo que não pode ser desconsiderado.

Crescimento e margens

As empresas de um trilhão de dólares são uma combinação rara de alto crescimento e altas margens. “São empresas com posicionamento de luxo, um forte motor de inovação e uma postura de gangster, esgotando todo o dinheiro do mercado para concentrar para si mesmos”, diz Galloway. Para ele, é o que o Google faz quando recebe grande parte dos investimentos em mídia digital, ou a Amazon quando tem metade do e-commerce americano.

As empresas “Benjamin Button”

No filme, Benjamin Button ficava mais jovem com o tempo. Na analogia de Galloway, as empresas “Benjamin Button” são aquelas que se tornam mais desejáveis e valiosas com a idade. Elas se valem do efeito de rede (as redes aumentam seu valor conforme têm mais usuários e podem acelerar seu crescimento) e criam mais fluidez em seus modelos de negócios. “Quanto mais as pessoas usam o Facebook ou o Google, mais o sistema é assertivo, entregando a oferta certa de forma personalizada”, explica.

O resultado aparece na valorização de mercado. Empresas cujos modelos de negócios se valem do efeito de rede são 35% das companhias listadas no índice S&P 500, mas representam dois terços do valor total.

Boas contadoras de histórias

Os sete itens anteriores não bastam: também é preciso ser um excelente contador de histórias. “É preciso criar uma narrativa empolgante, construindo uma visão de futuro que capture a imaginação das pessoas e permita que a empresa tenha acesso a mais recursos financeiros para fazer essa visão acontecer”, conta Galloway.

É o caso da Amazon com sua obsessão pelo cliente, do Facebook com criar um mundo melhor e do Google com a possibilidade de dar acesso a toda a informação existente no mundo. São visões claras e que engajam clientes, parceiros e investidores. E, com isso, blindam a empresa. Dificilmente a Amazon sobreviveria às inúmeras denúncias de condições de trabalho ruins em seus Centros de Distribuição se a narrativa da obsessão em fazer o melhor pelo cliente não fosse tão consistente.

Quanto mais a empresa cresce, mais aumenta a importância de um bom storytelling. “A performance das empresas pós-IPO tem uma relação direta com a quantidade de blábláblá em seus relatórios”, diagnostica Galloway.

Por onde me diferenciar?

Scott Galloway tem um roadmap para empresas que queiram acelerar seu crescimento com base nos caminhos trilhados pelas gigantes de tecnologia. “Onde estão as oportunidades de diferenciação no seu setor? Comece por aí”, diz.

No caso do varejo, as maiores oportunidades de diferenciação estão em três pontos:

1)   Integração vertical: quem controla da cadeia de produção à distribuição e comunicação com os clientes fica em vantagem.

2)   Storytelling: encontre um discurso consistente, com uma visão de futuro que engaje, e bata nessa tecla sempre. Em especial, pense em histórias que solucionem problemas dos clientes e que sejam quase impossíveis de serem copiadas.

3)   Receita recorrente: toda empresa deveria estar ativamente perseguindo uma forma de receita recorrente, pois ela gera mais dados sobre os clientes e mais dinheiro.

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